Desembargador do TJ-SP faz mediação e promove acordos dentro do gabinete.
Nomeado desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo em agosto de 2017, Luiz Guilherme da Costa Wagner aposta em conciliações feitas em seu próprio gabinete para dar celeridade e desafogar o Judiciário paulista. Desde maio, em seis datas mediou 34 casos, com dez acordos homologados, o que vê com animação. A medida, defende, humaniza o Judiciário perante a sociedade, resguarda o tribunal de novos recursos e acelera o julgamento. Na pior das hipóteses, ajuda o próprio trabalho, já que por vezes redige os votos logo após as sessões e o contato direto com as partes e seus respectivos advogados.
Desembargador adaptou sua sala para receber advogados e partes.
“Presenciei pessoas que vêm aqui sem se falar e com uma impressão ruim do Judiciário e terminam agradecendo, indo embora juntas. Há um pouco o mito de um Judiciário fechado. Uma coisa é olhar o papel frio. A outra é olhar no olho”, explica Costa Wagner, que não teve a experiência do contato direto com as partes nos julgamentos de primeiro grau. Ele foi escolhido por Geraldo Alckmin para ocupar vaga do quinto constitucional da advocacia. Integrou a lista sêxtupla da OAB-SP, e seu nome chegou à mesa do então governador como o menos votado entre os três candidatos escolhidos pelo Órgão Especial do TJ-SP. Na época, era membro do Tribunal Regional Eleitoral paulista na categoria advogado.
Não são todos os casos que o desembargador propõe a mediação. Ele escolhe casos que discutem valores baixos, sem grandes corporações envolvidas e nem que estejam tramitando há muito tempo. São características que militam em favor de um acordo, sem necessidade da imposição de uma decisão judicial, avalia o desembargador.
Uma vez a cada 15 dias, sempre às sextas, ele rearranja sua sala no 12º andar do Edifício 23 de Maio, no bairro Liberdade, em São Paulo. Inclui mesas e cadeiras, papel e canetas à disposição, com água, café e balas para agradar os envolvidos. Se um entendimento é alcançado, as partes assinam um termo de audiência que descreve o que foi acertado, e o acordo é homologado por decisão monocrática. Os casos, que seriam relatados por Costa Wagner, nem chegam a ser apreciados pelos demais membros da 34ª Câmara de Direito Privado, da qual é membro.
Foi o que ocorreu na tarde de 29 de junho, quando a advogada Maria Fernanda Ribeiro entrou no gabinete com o objetivo de arrastar uma ação monitória ajuizada contra seus clientes pelo maior tempo possível. Era um caso complicado, que envolvia cobrança de R$ 9 mil por prestação de serviço. Ela defendia um casal humilde e que dizia perder o sono por conta de uma dívida que via como injusta.
Na presença do desembargador, chegou-se a um acordo: o valor a ser pago ficou em R$ 4,5 mil, parcelado de uma forma que os devedores consigam pagar. O caso de fato se arrastava desde 2016 e mediação convocada por Costa Wagner deu um fim à disputa.
Conciliação em segundo grau
Costa Wagner comemora os resultados que alcançou em tão pouco tempo por meio de sistematização de uma prática ainda esporádica entre seus colegas. Ainda assim, ele conta ter se inspirado em relatos de desembargadores que, em casos de alta complexidade ou litigiosidade, alcançaram acordos em conversa fora da sessão de julgamento. A própria Resolução 125 do Conselho Nacional de Justiça, que instituiu a política de acordos no Judiciário, foi capitaneada por um desembargador da casa, Neves Amorim, quando foi conselheiro do CNJ.
Costa Wagner comemora a taxa de sucesso de quase um terço nas conciliações
Já há um setor destinado a essa prática: os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania do Estado (Cejusc). Dados do tribunal mostram que, em primeira instância, ele efetivamente desafoga o Judiciário, com 251.369 sessões realizadas em 2017 e 132.169 acordos alcançados. Uma taxa de acordos de 53%. Em segunda instância, o aproveitamento diminui: 284 audiências, com 136 acordos e 47,8% de sucesso. Em ambos os casos, a eficiência é maior do que a da experiência de Costa Wagner até o momento, que tem uma “taxa de sucesso” de 29%, segundo as próprias contas.
Os Cejuscs atuam gratuitamente em casos de áreas cível e de família, desde relacionados a Direito do Consumidor e cobranças a questões envolvendo união estável e pensão alimentícia.
Costa Wagner entende que as mediações no Cejusc, por vezes, têm tom demasiadamente informal, ainda que sob a vigência do Código de Processo Civil. No gabinete, ele diz que a grande diferença é justamente o contraste entre a formalidade do contato com um desembargador e a informalidade da conversa: é tratado por “Excelência”, mas procura deixar as partes à vontade para discutir o caso, delineando a possibilidade de um acordo. De cara, avisa que não vai entrar no mérito ou fazer pré-julgamento. E então dá início ao diálogo.
Quando perguntados pelo próprio Costa Wagner, advogados que compareceram ao gabinete naquela sexta-feira elogiaram a iniciativa. “Se essa audiência fosse no Cejusc, a conversa teria acabado na portaria, porque eu informei a proposta e a outra parte não aceitou”, disse Fernando Pereira Cardoso, advogado de uma rede de concessionárias que, condenada em primeiro grau a indenizar um cliente, buscou rediscutir a chance de um acordo.
“Às vezes, a conciliação mais atrapalha porque falta tato, parece que o mediador tomou parte”, comparou o advogado Dirceu Antonio Aparecido Machado, que defendeu o cliente. O caso foi adiado para consultar a diretoria da rede de concessionárias – dias depois, terminaria em acordo.
O valor de um acordo
Luiz Guilherme da Costa Wagner se anima com cada sucesso alcançado porque reconhece a dificuldade de se chegar a um acordo após a decisão de primeiro grau, quando uma das partes já ganhou. Mas não é incomum que nenhuma das partes saia satisfeita com a decisão judicial. E é aí que a mediação vira solução.
Naquela tarde de sexta-feira, teve sucesso em apenas um dos quatro casos mediados: obteve uma recusa, um pedido de adiamento e uma ausência – uma das partes não compareceu ao compromisso. O acordo só foi alcançado no caso da cobrança dos R$ 9 mil, no qual um engenheiro regularizou a planta de um imóvel de um idoso que, sem herdeiros, doou a residência a um casal. Este assumiu a dívida do serviço, apesar de alegar desconhecimento dela ao assinar o documento.
O engenheiro exigia ao menos R$ 6 mil por um acordo, e o casal dizia só poder pagar R$ 3,5 mil. Em um esforço conjunto, chegou-se ao montante de R$ 4,5 mil. “Bom não está, mas tenho que aceitar para acabar com o aborrecimento”, finalizou o engenheiro de 84 anos.