A Lei 9.307/96, que introduziu arbitragem no Brasil, atingiu a sua maioridade no ano passado, e já está de há muito consolidada como uma ferramenta segura e eficaz para a solução alternativa de conflitos. Entretanto, promulgada em setembro de 1996, foi somente em dezembro de 2001 que a Lei de Arbitragem (LA) teve a sua constitucionalidade confirmada pelo Supremo Tribunal Federal.
Por obra do acaso, tive a oportunidade de vivenciar in loco as dificuldades e as perdas de oportunidades que este interregno entre a promulgação da LAe seu reconhecimento constitucional causou no cenário internacional.
Entre os anos de 1997 e 2000 trabalhei nos Estados Unidos como advogado associado na sede de um grande escritório de advocacia norte-americano. Naquele exato período, o Brasil passava por ambicioso processo de privatização de empresas promovido pelo governo FHC. Grandes oportunidades para a aquisição de nossas estatais de telecom, energia, infra-estrutura e outras estavam em curso,e atraíam empresas e investidores do mundo todo.
Minha principal função era a de tentar esclarecer aos clientes do escritório interessados em participar no processo de privatização, na maioria corporações de atuação multinacional, como as coisas funcionavam em nosso país, qual era o arcabouço jurídico daqui, como operava o judiciário, em suma, como se dava o “Law of Land” no Brasil. Não era tarefa fácil. Como explicar a um estrangeiro de cultura anglo-saxônica, por exemplo, o cabimento de embargos dos embargos em agravo regimental ao agravo de instrumento?
Negociava-se intensamente a formação de consórcios entre empresas estrangeiras, que geralmente traziam o seu prestígio e know-how operacional, com empresas brasileiras, bancos de investimentos, fundos de pensão, visando, com isso,a ampliaçãodas possibilidades de êxito nos leilões de privatização.
O interessante era que, no mais das vezes, as partes conseguiam equacionar as questões mais complexas desses contratos, o modus operandi, a governança corporativa, a distribuição de resultados, mas, invariavelmente, esbarravam na elaboração da cláusula para a solução das controvérsias.
Todas as empresas estrangeiras, sem exceção, duvidavam, não sem razão, da capacidade do judiciário brasileiro de lidar,em tempo e com eficácia, com matérias de maior complexidade jurídica e, consequentemente, sempre insistiam na inclusão de cláusulas arbitrais, para que as controvérsias fossem arbitradas sob a regulamentação de renomadas câmaras de arbitragem, como a Câmara de Comércio Internacional (ICC) ou a American Arbitration Association (Triple A).
Coincidiu que, naquele mesmo momento,a constitucionalidade da nossa recém-nascida Lei de Arbitragem era fervorosamente discutida nos meios jurídicos de nosso país, o que resultou no óbvio receio das empresas estrangeiras, que temiam não conseguir executar no Brasil as sentenças arbitrais obtidas no exterior.
Por conta dessa insegurança jurídica, grandes possibilidades de negócio não se concluíram, contratos não foram firmados, transações de alto interesse para o país deixaram de ser realizadas por meros impasses quanto à eficácia da aplicação da nossa LA.
A decisão final que reconheceu a constitucionalidade da LA representou o epílogo de uma discussão que mobilizou o STF por quatro anos.
Narrei o episódio acima para estabelecer um paralelo entre a arbitragem e o ainda infante instituto da mediação, recentemente introduzido na legislação de nosso país pela Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015.
Se por um lado a Lei da Arbitragem levou anos para se firmar, acredito que a mediação logrará o mesmo êxito em espaço temporal menor. Para acelerar o processo de afirmação da mediação, é fundamental que advogados e executivos de nossas empresas reconheçam, por exemplo, a importância de uma cláusula arbitral escalonada, em que antes da instalação do tribunal arbitral, as partes busquem uma solução consensual através da mediação.
É necessário inocular em nossa cultura jurídica, tradicionalmente litigiosa, que as soluções alternativas de controvérsias economizam tempo, dinheiro e, sobretudo, melhoram e arejam o ambiente corporativo. Que venha a modernidade.
Rio de Janeiro, 07.06.2018.
Luiz Claudio Duarte
Advogado. Mediador. Árbitro